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Sou tantas e sou uma... Existo e sumo... Mergulho e retorno... Intensa, curiosa, aprendiz, crítica, sensível... Por vezes sábia. Vivendo na montanha-russa, em altos e baixos constantes... Metamorfose ambulante. Eu? "Contradigo a mim mesmo porque sou vasto" (Walt Whitman)

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Entre os muros da escola


Oi amigos!
Não deixem de ver o filme "ENTRE OS MUROS DA ESCOLA", ganhador da Palma de Ouro em Cannes. É um filme francês, que mostra a realidade das salas de aula em escolas públicas e a relação professor-aluno, nas séries equivalentes ao 6º até 9ºanos do Ensino Fundamental daqui e Ensino Médio (garotada de 13, 14, 15 anos de idade). Acabei de assistir (baixei da internet) e valeu muito a pena. Em muitos pontos, aquela realidade é idêntica à nossa.
Me permitam analisar um pouco:
- As escolas públicas francesas estão recebendo uma diversidade de alunos e culturas - imigrantes de vários países - e estão encontrando muitas dificuldades em lidar com isso, assim como encontramos aqui, onde a existência de vários "brasis", também com diferentes culturas, hábitos e costumes se faz presente, principalmente no ensino público; aqui também ainda estamos lutando pra aprender a lidar com isso e nos comunicarmos de forma efetiva;
- Os adolescentes mostrados no filme encontram-se bastante descrentes da importância da escola e do estudo, só se mostram motivados na hora do recreio e dos esportes, estão cada dia mais irônicos e agressivos com os colegas e com os professores, estão debochados, desrespeitosos e indisciplinados, já que aquilo tudo parece não fazer o menor sentido pra eles, além de sentirem-se perseguidos pelos professores e pela escola em muitos momentos, não sentindo-se compreendidos e amparados por eles;
- Os professores também sentem-se desmotivados, pois dar aula para turmas onde apenas um ou dois estão interessados é super frustrante, o que os faz tentar vários recursos e dinâmicas, nem sempre bem sucedidas, para tentar mudar esse quadro, procurando cativar os alunos de alguma forma e, muitas vezes, perdendo a paciência - o que é super humano - nesse processo que parece estar andando pouco ou quase nada;
- Os diretores e coordenadores (no nosso caso, orientadores também) buscam ouvir todos os lados e "costurar" essas relações, aplicam normas, impõem limites, organizam reuniões e acabam passando boa parte do tempo tendo que cuidar de casos de indisciplina e de organização da escola, incluindo aí a estrutura física da escola, entre outras coisas;
- Os "Conselhos de Disciplina" de lá julgam e acabam sempre expulsando alunos considerados "difíceis", após suspensões e outras punições, o que também acontece aqui, nas reuniões de professores e equipe diretiva, mesmo sendo proibido por lei e mesmo sabendo-se que, dessa forma, é muito mais provável que aconteça a evasão escolar ou a entrada desses adolescentes na marginalidade ao invés de funcionar como uma "lição" que os faça melhorar de alguma forma;
- Os pais desses alunos são pessoas simples, pobres, em geral de vida sofrida e que, lá na França, nem mesmo falam a língua do país, muitas vezes, o que corresponde aqui à dificuldade que encontramos em nos comunicar com os responsáveis por nossas crianças e adolescentes também, pois parece nitidamente, na prática, que também são duas (ou mais) línguas diferentes se encontrando e, aqui como lá, sabemos que chamar os pais para conversarmos pode levar os alunos a serem surrados, castigados e humilhados em casa depois, muitas vezes.
Enfim...
Nada muito diferente da nossa realidade não!
A busca do professor no filme é louvável. Ele usa a inteligência, a criatividade, é democrático, mas não consegue despertar o interesse dos alunos, na maior parte do tempo, como também acontece aqui. E olha que ele tenta muito fazer com que os alunos participem, falem do que gostam, sejam dinâmicos, mas eles estão mais é querendo que a aula acabe logo e que as férias cheguem logo também. E, infelizmente, isso é o que grande parte dos profissionais das escolas daqui (não só os professores) também acabam querendo... Até mesmo como reação ao estresse e desgaste do dia a dia, pois ser professor, na realidade atual, não está mole pra ninguém!
No entanto vemos, no final do filme, que nos momentos de descontração - jogo de futebol -, os alunos e os profissionais da escola se integram, interagem e fazem do estar na escola algo muito prazeroso. Isso também acontece aqui. Mas, mesmo assim, insiste-se em se manter principalmente aulas expositivas em todas as matérias, aquele modelo antigo do "cuspe e giz", o que é justamente o contrário desse dinamismo necessário e super presente, tanto na criança quanto no adolescente. A escola, nesse ponto, violenta a própria natureza curiosa e criativa dos alunos, até que não reste nada dessa natureza ali, dentro dos "muros da escola"...
Os adolescentes vão sempre questionar a autoridade (de forma crítica ou não; consciente ou não; debochada ou não), vão preferir estar com os amigos do que com os adultos, vão estar super ligados em sexo, terão sempre linguagem própria (incluindo gírias, palavrões..) entre eles, pois tudo isso FAZ PARTE DA ADOLESCÊNCIA. É normal. Não podemos reagir a isso como se fôssemos tão adolescentes quanto eles! Mas no dia a dia das salas de aula lotadas é bem difícil...
Os alunos precisam de limites? Claro que sim!!! Mas não adianta a escola ser democrática no discurso e manter práticas tradicionais, conservadoras, voltadas para a pura e simples obediência. Isso só vai continuar cultivando a rebeldia dos alunos! Nunca ajudaremos a formar cidadãos com o mínimo de autonomia, espírito crítico, iniciativa e criatividade assim! E, sem essas características minimamente desenvolvidas, como poderão se virar bem nesse mundo louco que nós, adultos, estamos entregando pra eles??? De alguma forma, vejo que eles percebem isso intuitivamente e reagem assim, na defensiva, mostrando que esse não é o mundo que querem.
Ao mesmo tempo, em uma sociedade cada dia mais individualista e consumista como a nossa, com diferença de classes sócio-econômicas gritantes, fica complicado desenvolvermos outros valores junto ao aluno, já que o próprio ser humano tem sido cada vez mais tratado como algo descartável, numa sociedade em que o maior valor é realmente o dinheiro e o status, o poder e o prestígio que ele pode comprar, o que os jovens veem muito bem. Aí chegamos pra eles e falamos da importância do estudo e eles não entendem, não acreditam e só se interessam se for pra ganhar dinheiro de forma fácil e rápida, já que o imediatismo também impera.
É tudo fruto do capitalismo? Acho que só em parte. É fruto também das nossas contradições e do enorme desconhecimento que o homem ainda tem sobre o seu próprio funcionamento interno (emocional, psíquico, inconsciente...), o que o faz eleger inimigos sempre fora de si e permanecer em luta apenas contra estes, muitas vezes acabando por ser totalmente incoerente no que diz respeito ao que defende, repetindo e fortalecendo, sem perceber, a falsa dicotomia "teoria X prática", "razão X emoção", entre outras. Isso acontece frequentemente como, por exemplo, quando alguém defende a democracia e a justiça social e age de forma absolutamente intolerante e autoritária, sem conseguir ouvir ou respeitar quem pense diferente dele ou avalie as coisas de outra maneira. Sem dúvida é muito mais fácil seguir normas rígidas, ser autoritário, manipular (mesmo justificando pra si mesmo que é com a melhor das intenções...), julgar, rotular do que aprender a lidar com as diferenças, cooperar, trocar, estar aberto pra aprender sempre, fazer constantemente uma auto-crítica honesta, etc.
E outra coisa importante: o conhecimento é algo DINÂMICO, em constante renovação, fruto de novas descobertas, mas, no entanto, a escola ainda é tão arcaica que funciona na direção oposta a isso, apresentando conteúdos de forma estanque e cristalizada, sem interrelacioná-los e repelindo qualquer conhecimento novo que chegue a ela e que coloque em cheque alguns de seus paradigmas e vícios. Já senti isso na pele várias vezes (as contribuições do pedagogo na escola costumam ser repelidas e vistas como "teóricas demais", muitas vezes, pois dizem que ele "não está dentro da sala de aula pra saber das coisas", no que esquecem que TODO PEDAGOGO É PROFESSOR TAMBÉM e já deu aula)! Afinal, ainda valoriza-se mais os anos de experiência prática (mesmo que com pouco ou nenhum estudo) e o senso comum do que o que tem sido descoberto e avaliado por pesquisadores seríssimos, no mundo todo. A escola não valoriza a pesquisa, recebendo-a sempre como "algo puramente teórico que não tem nada a ver com a realidade prática da escola". Mas as pesquisas são feitas em cima de observação de práticas também! Uma coisa não está separada da outra! E muitas são feitas por professores, inclusive! E como a escola quer que o aluno valorize o estudo e o conhecimento adquirido pela humanidade ao longo dos tempos se ela é a primeira a criticar, debochar e rejeitar os novos conhecimentos e descobertas??? É absurdamente INCOERENTE!! Como cativar os alunos assim, se eles veem que grande parte dos "educadores" não lê, não gosta de estudar, não se atualiza, não se renova...??? Assim fica impossível!!! É uma dupla mensagem o tempo todo: "façam o que eu digo, mas não façam o que eu faço"! "Estudem, mas quando alguém chegar pra vocês com idéias novas, digam que vocês é que sabem das coisas por causa dos seus "anos de experiência" nisso ou naquilo". "Desconfie do conhecimento sempre", é o que passamos pra eles, o que é muito diferente do que devíamos passar, que é: tenham sempre espírito crítico diante do que receberem sim, mas saibam ouvir, refletir e pesquisar antes de julgar alguma idéia, pessoa ou prática, pois a maior sabedoria é se manter aberto a novas aprendizagens na vida a cada momento, questionando, buscando e desenvolvendo saberes, ao invés de ficar na posição rígida e defensiva de negação e rejeição (Freud explica!).
O medo do novo é um dos maiores do ser humano e isso deveria ser ensinado na escola. O medo do "diferente" geralmente vem da ignorância que leva aos preconceitos, à intolerância e, no final, à todo tipo de conflitos, confrontos e guerras. Ensinar - e primeiro o educador precisa aprender mais sobre isso! - sobre como funciona o ser humano, em termos de comportamento e reações emocionais seria, sem dúvida, muito mais interessante e útil pra vida de nossos alunos, não acham???!!!!!
Enfim...
Me alonguei porque esse tema me entusiasma e o filme é realmente muito bom, tendo despertado essa necessidade de botar no papel e compartilhar com vocês.
NÃO DEIXEM DE VER O FILME!!!!!
Beijos para todos,
Regina Milone.